Tema central
NUSO Nº 2021 / Agosto - Setembro 2021

Conjuntura crítica, transição de poder e esvaziamento latino-americano

Os efeitos da emergência sanitária, econômica, social e política serão sentidos com especial intensidade na América Latina e no Caribe. É possível observar ao mesmo tempo uma impotência política da região diante da conjuntura global crítica. Diante desse quadro, torna-se importante caracterizar as peculiaridades da dupla crise do regionalismo latino-americano e do multilateralismo interamericano. As causas do processo de «esvaziamento latino-americano» respondem, sobretudo, a dinâmicas que operam dentro da região, agravadas pela pandemia.

Conjuntura crítica, transição de poder e esvaziamento latino-americano

O horizonte como desafio

O panorama internacional para o biênio 2021-2022 se apresenta como um dos mais turbulentos desde o final da Guerra Fria. Os saldos da emergência sanitária e do afundamento da economia mundial em situações de pobreza, desigualdade, desemprego, fome, deslocamento, mal-estar social e instabilidade política serão sentidos com intensidade em todos os cantos do planeta, mas especialmente na América Latina e no Caribe. Além disso, a escalada da rivalidade entre os Estados Unidos e a China após a pandemia, com suas consequências geopolíticas, tem gerado crescentes pressões sobre a erodida estrutura multilateral global. Observamos há tempos um complexo processo de redistribuição de poder, com o iminente declínio dos eua, a acelerada ascensão da China como nova grande potência, o ressurgimento de uma Rússia determinada e perturbadora, e a queda de influência da Europa. Mas, em 2020, enfrentamos algo mais complexo.

Do que estamos falando? De uma conjuntura crítica em meio a uma transição de poder que abala as bases da ordem mundial liberal em todos os âmbitos. De uma conjuntura crítica no sentido de uma situação histórica na qual, ao se romperem os equilíbrios prévios da ordem social – neste caso, em escala global –, as lideranças políticas enfrentam a necessidade de buscar alguma das diferentes opções de reconstrução de novos equilíbrios ou se adaptar às novas circunstâncias. E falamos de uma transição de poder no plano sistêmico na medida em que há uma disputa, entre uma potência em declínio e outra em ascensão, por distribuição relativa de capacidades materiais, influência e prestígio, com um componente inerente de conflito.

Toda conjuntura crítica obriga à ação, e toda transição de poder é, por definição, conflitiva. Aproxima-se assim um novo bipolarismo de natureza muito distinta da bipolaridade da Guerra Fria em, ao menos, quatro aspectos fundamentais: o alto nível de interdependência e interconexão global; a baixa polarização sem a estruturação de blocos rígidos (até agora); as lógicas imprecisas e/ou difusas das lideranças dominantes; e, por último, a presença de diversos tipos de regionalismos e graus de regionalização. Nesse quadro, ainda estão por se delinear as capacidades de condução das instituições políticas no nível mundial para administrar a atual conjuntura crítica e sua multidimensionalidade sanitária, econômica, social, política e de segurança1.

Uma sucessão de processos interconectados explica a complexidade atual. A grande recessão econômica irrompeu em 2008 sem que, apesar das promessas do g-20, tivesse sido acordada uma regulação eficaz do capital financeiro. Foi se enraizando uma globalização assimétrica portadora de desigualdade e de uma sensação de precariedade pelo desmantelamento do Estado de Bem-estar. Estamos diante de uma retração persistente da democracia liberal, sem que possamos prever a que espaços híbridos ou autoritários a última onda democrática poderia chegar ou quais são as condições para que perdurem sociedades fraturadas, em declínio e/ou mobilizadas.Esse é o contexto em que eclodiu a covid-19, uma pandemia que revalida a desilusão com relação ao estado de coisas, mas que não necessariamente implica que, agora sim, de imediato, se construam pactos sociais inclusivos, Estados pujantes e um sistema mundial com capacidade de resposta. Assistimos a um desses momentos em que os ciclos longos e curtos da história se relacionam com acontecimentos inesperados para perturbar tudo, colocando as regiões periféricas como a latino-americana diante de um dilema de repensar coletivamente suas relações intra e extrarregionais ou seguir a lógica do «salve-se quem puder» para navegar sem portos seguros.

A particularidade do presente latino-americano é que a região em seu conjunto enfrenta essa maré de transformações sistêmicas em uma posição ruim, após um processo longo e gradual de perda de gravitação internacional, dividida e fragmentada, sem uma voz comum e sem mecanismos funcionais de articulação nem lideranças capazes de comandar a ação coletiva. Não foi assim em contextos históricos anteriores como a crise de 1929, o pós-guerra de 1945 e a queda do Muro em 1989, três pontos de inflexão nos quais a região demonstrou capacidade de resposta e visão de futuro. O momento atual é diferente pela conjugação de fatores que conduziram ao que aqui denominamos o «esvaziamento latino-americano» para nos referirmos à situação de ausência deliberada de ação coletiva da região que, caso não se reverta, poderia levar à perda de sua condição de ator no sistema global e a sua mera expressão geográfica.O processo que conduz a este estado de coisas é o tema principal deste artigo, que possui duplo propósito: (a) oferecer algumas reflexões de caráter analítico que contribuam para compreender a etapa atual de impotência política da América Latina e do Caribe diante da conjuntura crítica global e da transição de poder mundial em andamento; (b) identificar e caracterizar as peculiaridades da crise simultânea do regionalismo latino-americano e do multilateralismo interamericano. O argumento central é que as causas do processo de esvaziamento latino-americano respondem, sobretudo, a dinâmicas que operam dentro da região, agravadas hoje pela pandemia. Tal linha interpretativa não pretende descartar a incidência de fatores externos, particularmente, os danos infringidos pelas simbioses e efeitos visíveis da preeminência dos eua, aprofundados durante o governo de Donald Trump; ela busca insistir em que as rotas de escape do abismo e de recuperação de impulsos construtivos serão próprias da região, levarão algum tempo e exigirão ir além da mera restauração de fórmulas do passado.De regiões e regionalismos: configurações econômicas e tecidos políticos comuns

O século xx terminou com uma onda expansiva de regionalismo, com projeção mundial, que se manteve ativa nos 15 anos seguintes. Em meio a esse contexto, durante o período 2011-2018, a quantidade de acordos regionais de comércio aumentou de 445 para 669, isto é, cresceu em torno de 50%2. Essas cifras compreendem um aumento significativo de uniões aduaneiras e acordos de integração econômica de natureza crescentemente plurilateral, mais que bilateral. Nessa onda, foram observadas novas configurações multirregionais de megaproporções, como a Parceria Transpacífica (tpp), assinada em 2016, e a Parceria Econômica Regional Abrangente (rcep), acordada em novembro de 2020 entre a Associação de Nações do Sudeste Asiático (asean, todas em suas respectivas siglas em inglês) e China, Japão, Coreia do Sul, Nova Zelândia e Austrália. Um mesmo tipo de movimento pode ser percebido com relação às organizações regionais com agendas ampliadas que expandiram sua projeção, seja em quantidade, no incremento de associações simultâneas por parte dos Estados, ou em pontes de diálogo e colaboração inter-regionais3. No último caso, encontram-se na América Latina e no Caribe iniciativas birregionais multilaterais como o acordo de livre comércio, ainda inconcluso, entre a União Europeia e o Mercado Comum do Sul (Mercosul), com base no Acordo-Quadro de 1999, e iniciativas bilaterais como o Fórum China-Celac (2014).

Entretanto, as tendências mencionadas não foram homogêneas, lineares nem igualmente resistentes às mudanças produzidas pelas conjunturas internacionais. Quando comparadas as realidades da Europa, Ásia, África e América Latina, são inegáveis os contrastes com relação ao tipo e à quantidade de recursos políticos e institucionais sobre os quais se fundamentam e suas respectivas possibilidades de governança regional. Também é importante destacar a diversidade em matéria de alinhamentos e graus de exposição ou vulnerabilidade diante das grandes tendências globais, particularmente a tensão entre os eua e a China. Os diferentes níveis de exposição se tornam visíveis nos contextos de conflitos e/ou crises severas, em que as tendências rumo à fragmentação e às rivalidades são exacerbadas por um amplo arco de motivações, sejam elas de caráter ideológico, religioso, soberanista, nacionalista ou separatista. Nesse tipo de diferenciação, evidenciam-se os contrastes Norte-Sul dos regionalismos contemporâneos. Por um lado, o processo europeu pertence a outro caráter de construção coletiva quando são comparados os níveis de autonomia geoestratégica e os degraus ascendidos na sustentabilidade da equação paz e segurança/integração econômica. Por outro, estão as regiões que integram o Sul global, que apresentam diferenciações quanto a seus pesos estratégicos no tabuleiro da política internacional. Realidades produzidas por fragmentações e polarizações políticas intrarregionais podem tanto aprofundar a irrelevância estratégica como levar à obtenção de uma parcial relevância. Exemplos dessa tendência são o lugar ocupado pelo Oriente Médio como causador de 78,4% dos vetos no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (onu), ou o da África como região que concentra 64,2% da agenda do mesmo Conselho.

As respostas regionais e inter-regionais para a pandemia da covid-19 também evidenciaram as particularidades dos diferentes regionalismos. São observadas reações que vão na direção de produzir mais regionalismo – como em partes da Ásia e da África –, bem como movimentos compensadores que buscam aprofundar os vínculos e compromissos de coordenação e cooperação. Em termos institucionais, a União Europeia, a asean e a União Africana (ua) vêm buscando aprofundar e ampliar agendas coordenadas para lidar com os danos no campo sanitário do prisma do bem público regional. Já a América Latina tem se posicionado de costas para as tendências dominantes do regionalismo no mundo4.

América Latina e Caribe, de ontem a hoje

A primeira década do século xxi mostrou o que alguns denominaram uma «nova» América Latina, com maior crescimento, estabilidade democrática e autonomia internacional. O dado mais transcendental foi o considerável aumento dos preços dos produtos primários agrícolas, minerais e energéticos exportados pela região, o que permitiu elevadas taxas de crescimento e a possibilidade de reforçar a capacidade dos cofres públicos, então reduzida devido às medidas pró-mercado dos anos anteriores. Também foi possível, particularmente na América do Sul, recuperar uma aspiração histórica de construir sua própria voz política fundamentada em uma agenda de coordenação intrarregional que buscava uma expressão coletiva diante de assuntos-chave – como infraestrutura, energia e políticas de defesa – e promovia a diversificação das relações exteriores e das alianças extrarregionais. Em um primeiro momento (2005-2015), a combinação gerada entre a ascensão econômica da China e a menor atenção política dos eua como consequência de suas prioridades estratégicas representou externalidades favoráveis para que essas mudanças ocorressem.

Apesar de um contexto interno e internacional propício, a matriz social, política e econômica dos países da região não mudou significativamente. A pobreza foi reduzida por meio de políticas inclusivas, mas o mesmo não ocorreu com a fragilidade dos setores populares obrigados a conviver com níveis persistentes de desigualdade de direitos e condições de vida. Foi recuperado o papel do Estado, mas não necessariamente suas capacidades de fornecer bens públicos de modo sustentável. Ainda que os indicadores mais importantes tenham melhorado, não houve um aprimoramento considerável em matéria de competitividade tecnológica, inovação científica ou diversificação da estrutura produtiva. As democracias eleitorais continuaram funcionando sem que houvesse maiores avanços institucionais nos sistemas de representação política, Estado de direito e liberdades civis de modo a evitar deslizes políticos e as más práticas que condicionavam a qualidade da governabilidade democrática. Entre vários obstáculos, destacam-se o processo de judicialização da política e o agravamento das condições de segurança pública, com suas viciadas ramificações nos aparatos estatais.

Os déficits mencionados logo se fizeram sentir, com o desgaste que distanciou os governos de esquerda e centro-esquerda das expectativas transformadoras dos anos anteriores. A resposta política foi dada nos anos 2014-2019, quando em diversos países da região assumiram governos que buscaram descartar as orientações prévias e defenderam a aplicação de receitas econômicas liberais acompanhadas de políticas exteriores que explicitavam afinidades ideológicas com os eua. Uma fadiga política semelhante afetou os governos de direita e centro-direita que haviam sustentado opções de regionalismo aberto, como a Aliança do Pacífico (ap). Essas tendências se refletiram em um processo de desgaste generalizado de organizações que haviam gerado uma expectativa de rejuvenescimento do regionalismo, crescentemente prejudicadas pela interiorização de polarizações que estimulavam um divisionismo intralatino-americano, fundamentado principalmente em considerações de curto prazo de política interna. Um misto de estagnação, fragilidade e decadência passou a atravessar, com diferentes intensidades, o Mercosul, a Comunidade Andina de Nações (can), a ap, a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (alba), a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), a Organização dos Estados Americanos (oea) e a União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Entre abril de 2018 e o início de 2019, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai e Peru abandonaram a Unasul, caminho seguido também pelo Uruguai em março de 20205. Por sua vez, foi criado em março de 2019 o Fórum para o Progresso e Desenvolvimento da América do Sul (Prosul), com a participação da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Guiana, uma iniciativa com resultados efêmeros e sem grandes consequências até este momento.

Outro importante fator para o processo de esvaziamento regional, exposto muito resumidamente, foi a ausência de lideranças regionais fortes e propositivas com projeção de longo prazo e capacidade persuasiva. No caso do Brasil, a dissociação do multilateralismo regional foi deliberada e contundente, ao passo que no México são projetadas iniciativas minimalistas e tímidas durante a Presidência pro tempore da Celac que, embora consigam manter em funcionamento o mecanismo em temas de cooperação técnica evitando questões polêmicas, não permitem abordar os assuntos que dividem realmente a região6.

Sem dúvida, a situação na Venezuela tem sido o epicentro da crise do regionalismo latino-americano. A agenda regional foi afetada pelos efeitos transfronteiriços da situação econômica e social interna, pela crescente polarização ideológica e por sua canalização política na escalada de diferenças entre os eua e o regime venezuelano. Do ponto de vista interno, tem sido observado um contínuo movimento de fechamento político do governo de Nicolás Maduro, com forte impacto econômico e social. No último biênio, a crise econômica e a agravada crise humanitária na Venezuela – produto da pobreza, do desemprego, da desvalorização da moeda local, da falta de investimentos e de outros temas conexos – provocaram um crescimento econômico negativo e uma deterioração dos indicadores sociais no país7. Mais de cinco milhões de venezuelanos emigraram e continuam emigrando, em um processo que afetou os países vizinhos de diversas formas. Ao mesmo tempo, observa-se uma crescente internacionalização da crise venezuelana, no contexto de uma situação estratégica fechada entre o interesse dos eua e de seus aliados regionais de não permitir a presença política de potências e poderes intermediários na região, e a composição de alianças do regime de Maduro com um número significativo de potências e países intermediários como China, Rússia, Turquia e Irã. Contudo, essa internacionalização não reverteu favoravelmente a situação de impasse disruptivo para reposicionar a região no tabuleiro da política mundial8.

Em vizinhança e estreita conexão com a crise venezuelana, observa-se a contínua desidratação do pós-conflito na Colômbia diante das dificuldades do pleno cumprimento do Acordo de Paz de 2016. Tanto a Venezuela como a Colômbia se destacam hoje na América do Sul como países onde são gerados fluxos constantes de migração forçada e, consequentemente, realidades violentas para milhões de seus cidadãos, com impacto direto sobre as condições de segurança em partes extensas da sub-região andina9.

Um flagelo humanitário comparável ocorre por todo o espaço meso e norte-americano, ainda que lamentavelmente não atraia a mesma atenção e preocupação internacionais ou regionais, e inclusive sub-regionais. A situação se agravou com o fechamento das fronteiras mexicanas e centro-americanas imposto unilateralmente pela administração Trump no intuito de conter as caravanas de migrantes que rumam aos eua, expulsos pela grave situação de insegurança, precariedade econômica, deterioração ambiental e desastres naturais em seus países. Um legado de acordos bilaterais migratórios impostos pelos eua, juntamente com o encerramento das políticas de asilo e refúgio, acabou se transformando em uma bomba-relógio.

O que se observa na América Latina e no Caribe é o estreitamento do vínculo entre fragmentação intrarregional e fragilidade internacional, em um tipo de círculo vicioso que tem se agravado com grande velocidade desde 2018. A perda de gravitação internacional já era visível anteriormente por indicadores de todo tipo. Quando se olha com atenção para a trajetória regional em matéria de votações convergentes no âmbito da onu, participação nas exportações mundiais, primarização das economias, investimento em ciência e tecnologia, índices de desigualdade, atributos militares e ranking comparado de soft power, nota-se o declínio da América Latina em contraste com outras regiões. O enfraquecimento e a fragmentação geraram mais dependência externa, tanto de um poder declinante como o dos eua como de um poder ascendente como o da China. No México e na América Central, até mesmo governos de esquerda e de centro optaram por se alinhar com os eua como uma resposta pragmática de apaziguamento ou acomodação diante do unilateralismo e do «dividir para conquistar» do governo de Trump. O corolário estratégico é o deslizamento em direção a modos de anuência em lugar de opções autônomas, o que afeta, com diferentes modalidades e intensidades, os diversos eixos de articulação sub-regional da América Latina (Mesoamérica, América Central, Caribe, mundo andino, Cone Sul, América do Sul, Atlântico e Pacífico da América Latina).

Esse é o cenário regional em que surge a covid-19. A pandemia se insere em um contexto de desilusão gerada por desaceleração econômica, convulsão política, descontentamento social e desagregação diplomática, acompanhada por polarizações políticas intrarregionais. A crise sanitária desembocou na pior crise econômica da história latino-americana, que provocará um retrocesso de dez anos na renda por habitante. Além desses indicadores, é previsto também um aumento de 5,4% do desemprego como consequência da contração econômica, o que desencadeará um crescimento na quantidade de pessoas em situação de pobreza10. Cabe também analisar os efeitos da pandemia sobre a interação da América Latina com o restante do mundo. Enquanto o comércio mundial caiu 17% entre janeiro e maio de 2020, a América Latina foi a região em desenvolvimento mais afetada por essa contração, com uma queda de 26,1% em suas exportações e de 27,4% nas importações11. A diversidade das respostas nacionais para a pandemia e a insuficiência de tais respostas perante a gravidade da crise sanitária, econômica e social nos países da América Latina e do Caribe indicam que, em 2021, os problemas associados à pandemia continuarão sendo uma agenda pendente e prioritária na região.

Foram publicados diversos escritos sobre os tropeços que levaram ao momento crítico atravessado pelo multilateralismo latino-americano e seu vínculo com a crise do regionalismo pós-liberal e o processo prévio de estagnação intermitente do regionalismo aberto. Prevalece a percepção de que essa realidade encontra sua principal explicação em um processo de fadiga estimulado em grande medida – mas não só – por contextos internos marcados pela polarização ideológica e pela fragmentação política, com impacto desarticulador sobre os diferentes esquemas de integração e cooperação da região12. Entre os pontos de concordância sobre grandes causadores políticos destacados nesta bibliografia, são mencionados: o poder de erosão do impasse venezuelano, o impacto do isolacionismo do Brasil com o corolário do desaparecimento da Unasul e, por último, a retirada do México, com a consequente retração dos mecanismos centro-americanos e da ap; no plano extrarregional, a rivalidade eua-China e a reduzida e/ou ambivalente presença europeia. Ao mesmo tempo em que é valiosa e relevante para compreender o estado da situação, em seu conjunto, esta bibliografia leva a concluir que o regionalismo latino-americano perdeu sua capacidade de se materializar. Longe de questionar essa ideia, gostaríamos de adicionar elementos de complexidade.

De uma perspectiva ontológica, o regionalismo para a América Latina e o Caribe esteve associado a duas rotas que historicamente mantiveram seu paralelismo com diferentes graus de tensão, autonomia e/ou diálogo. A convivência entre dois sentidos de coletivo – a unidade latino-americana-caribenha e uma comunidade interamericana – constituiu mais um fator de divisão e dispersão que de união e fortalecimento recíproco. Inegavelmente, a expressão mais aguda da tensão entre os dois caminhos ocorreu com a confrontação alba-oea nos anos 2016-201913. Durante 2020, observou-se a culminação de um desmonte simultâneo e igualmente danoso. A sequência de episódios ocorridos no sistema interamericano foi eloquente nesse sentido.

A acelerada degradação do sistema interamericano

O sistema interamericano, entendido como o conjunto de instrumentos e instituições configurados pelas relações entre os eua e a América Latina ao longo de mais de sete décadas, encontra-se em estado crítico após uma longa história de altos e baixos. Durante a Guerra Fria, seu funcionamento se subordinou às lógicas assimétricas de segurança, que refletiram a preeminência estadunidense na região e impediram um multilateralismo integral e efetivo que atendesse às prioridades latino-americanas. Posteriormente, o pós-Guerra Fria abriu novos horizontes ao permitir a ampliação da agenda para temas de comércio, defesa da democracia, proteção dos direitos humanos e segurança cooperativa, com a adoção do Compromisso de Santiago com a Democracia e a Renovação do Sistema Interamericano e da Carta Democrática Interamericana em 2001. O período compreendido entre 1990 e 2004 foi de revisão e inovação conceitual, normativa e institucional, mas esse processo foi interrompido pelos efeitos do ataque terrorista de 11 de setembro de 2001 e o retorno da agenda de Washington a temas de segurança e terrorismo. A partir de então e da crescente divergência entre distintas visões de regionalismo na América Latina – já não só de orientação liberal, mas também desenvolvimentista e autonômica –, o sistema interamericano, e particularmente a oea, entrou em um período de irrelevância institucional e zigue-zague político diante do desinteresse da Casa Branca e dos avanços de um multilateralismo latino-americano dissociado da ingerência estadunidense, mas com densidade institucional escassa e menor cobertura regional14.

A última tentativa de reconfiguração das relações entre Washington e América Latina veio dos eua de Trump e contou com o apoio de um número significativo de governos latino-americanos para atender aos objetivos, interesses e preferências exclusivas dos setores mais conservadores de Washington, de acordo com a lógica dos eua primeiro e com os interesses de algumas diásporas latino-americanas nesse país, particularmente, cubana, colombiana e venezuelana, majoritariamente com base no estado da Flórida. Os resultados alcançados nessa direção foram favorecidos pela sinergia singular estabelecida entre a Casa Branca e o secretário-geral da oea, Luis Almagro, com o acompanhamento e a liderança ativa de alguns dos países reunidos no Grupo de Lima desde 2017 para coordenar posicionamentos diante da crise venezuelana. Essa situação conduziu a uma degradação sistemática das instituições interamericanas em quatro âmbitos fundamentais: a defesa da democracia, a partir da oea; a provisão de segurança coletiva, a partir do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (tiar); a proteção dos direitos humanos, a partir da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (cidh); e a assistência financeira, a partir do Banco Interamericano de Desenvolvimento (bid).

Nos últimos quatro anos, a Secretaria Geral da oea tem interpretado a tarefa de defesa da democracia como a de promover uma mudança de regime na Venezuela. De fato, o próprio Almagro transverteu a organização quando, em fevereiro de 2019, assumiu um papel ativo de perseguição ao governo de Nicolás Maduro para apoiar a fracassada tentativa de entrada forçada de ajuda humanitária na Venezuela. O mesmo protagonismo foi buscado nos contatos com os governantes do Grupo de Lima, os funcionários de alto escalão da Casa Branca e representantes da oposição venezuelana. A saída da Venezuela da oea ocorreu em 2019, ao mesmo tempo em que a organização reconhecia Juan Guaidó como «presidente interino» do país.

Em seguida, a oea atuou como catalisador do processo de rompimento institucional na Bolívia em 2019, legitimado pela interpretação dos resultados eleitorais de sua equipe auditora, mesmo que essa interpretação não tenha sido validada por outros atores internacionais nem por especialistas eleitorais técnicos e acadêmicos. Uma rápida articulação, com fins desestabilizadores, de setores políticos internos com as Forças Armadas pressionou o presidente Evo Morales a deixar o cargo, o que levou a um interregno autoritário de um ano no país. Em setembro de 2020, as novas eleições resultaram na vitória categórica de Luis Arce Catacora e do Movimento para o Socialismo (mas). Nessa ocasião, a presença da onu e da ue foi fundamental para dissociar a prática da observação eleitoral internacional da atuação descuidada da oea um ano antes.

Com respeito ao tiar, sua invocação em setembro de 2019, a partir da solicitação da Colômbia e para lidar com a situação na Venezuela, situou a região na «alta política mundial» como não havia estado desde a crise dos mísseis em Cuba de 1962, identificando um tipo de perigo para a segurança internacional na América do Sul no duplo contexto da «guerra contra o terrorismo» e da «guerra contra as drogas», lideradas pelos eua. O uso desse recurso reforçava a sinergia gerada entre a oea e o Comando Sul em seus esforços compartilhados para identificar a Venezuela como uma ameaça regional. Tal securitização se aprofundou a partir da ativa agenda de colaboração militar entre a Colômbia e o Brasil com o Comando Sul.

No caso da cidh, os acontecimentos apontam para um embate que ameaça uma árdua construção institucional orientada por princípios de autonomia, rigorosidade e independência. Depois de superar suas dificuldades financeiras em 2016, a cidh passou a enfrentar tensões de outra natureza. A partir da posse de Trump, os direitos humanos perderam prioridade nas agendas estadunidenses de políticas externa e interna pelo avanço e assertividade dos grupos conservadores evangélicos organizados contra o aborto e os direitos lgbti+. Os eua se recusaram a participar das audiências da cidh sobre imigração no início de 2017, se retiraram do Conselho de Direitos Humanos da onu em 2018 e reduziram ano a ano os aportes orçamentários para a promoção da democracia e dos direitos humanos. Em 2019, o país reduziu sua contribuição para a cidh ao acusá-la, de forma desatinada e injustificada, de promover a legalização do aborto e, em 2020, impôs sanções contra a promotora-chefe do Tribunal Penal Internacional, Fatou Bensouda, por «tentativas ilegítimas de submeter os estadunidenses à sua jurisdição». Às decisões dos eua se somaram outras da América Latina. Em abril, e na única declaração relevante, cinco países do Prosul (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e Paraguai) exigiram que a cidh respeite «o legítimo espaço de autonomia» dos Estados depois de insinuarem sua intromissão em assuntos internos. Os questionamentos com relação à cidh viriam também de governos e setores da esquerda latino-americanos incomodados pelas resoluções da Comissão contra políticas de intransigência e repressão por parte de governos tão diferentes como os da Venezuela, Nicarágua, Chile e Equador diante das mobilizações e protestos sociais em 2019 e 2020.

Com esse complexo pano de fundo, desencadeou-se em 2020 mais uma fratura entre o secretário-geral da oea e a cidh que colocou em risco a autonomia desta última. A não aceitação de Almagro da decisão unânime dos sete membros da Comissão de renovar o mandato de seu secretário executivo, Paulo Abrão, expôs no seio do órgão mais prestigiado da organização a polarização que caracteriza as fissuras interamericanas.

Finalmente, cabe mencionar a crise gerada no bid a partir do processo de eleição de um novo presidente em outubro de 2020. Nesse caso, dois fatos convergiram. O primeiro deles é que o governo de Trump decidiu assumir o controle do banco, que os eua ajudaram a criar e financiar, com o propósito de condicionar a provisão de créditos e limitar a expansão da China na América Latina, especialmente em projetos de infraestrutura, energia e tecnologia. O segundo é que a América Latina mostrou mais uma vez sua disfuncional fratura, que reflete divisões políticas acumuladas, ao não contar com uma candidatura de consenso e peso. De fato, a apresentação do candidato estadunidense Mauricio Claver-Carone produziu fissuras regionais visíveis. Brasil, Colômbia, Uruguai, Paraguai e Equador o apoiaram de forma automática, o que significou uma rejeição aos candidatos apresentados pela Argentina e pela Costa Rica. Por sua vez, entre as quatro maiores economias da região, ocorreu outra divisão: o Brasil e a Colômbia se manifestaram favoravelmente à eleição estipulada para setembro, ao passo que a Argentina e o México, com o apoio do Uruguai e do Chile, solicitaram o adiamento da votação em decorrência da pandemia. Esse grupo questionava o descumprimento por parte dos eua do pacto político tácito mantido desde 1959, segundo o qual a Presidência do bid seria ocupada por um latino-americano. Diante da impossibilidade de frear a ação divisionista dos eua ou obstruir a votação por falta de quórum, a Costa Rica e a Argentina retiraram separadamente suas candidaturas, o que abriu a abstenção como única possibilidade. Único candidato na disputa, Claver-Carone, acabou eleito com 30 votos (equivalente a 66,8% dos apoios), enquanto a abstenção obteve 16 votos (cinco deles da região: Chile, Argentina, México, Peru e Trinidad e Tobago; e 11 extrarregionais, especialmente europeus).

A chegada de um novo governo democrata aos eua em 2021 suscita perguntas sobre o futuro funcionamento e eficácia do bid, seja em função do déficit de legitimidade do processo eleitoral de sua nova Presidência ou dos desafios programáticos impostos com a profunda crise econômico-social agravada pela covid-19.

Reflexões finais

É de se esperar que um esforço para preencher o que chamamos de esvaziamento latino-americano não surja com a mesma velocidade com a qual se chegou a tal condição. Buscamos indicar de que forma esse impulso demolidor, impulsionado por uma sobrecarga de politização e polarização ideológica, operou de forma simultânea nos âmbitos do regionalismo latino-americano e do multilateralismo interamericano. Além da fragmentação já apontada, a situação atual é de cooperação reduzida, dada a extinção ou inoperância na prática de diversos esquemas de integração econômica e concertação política que, em seu momento, contribuíram para dar voz à América Latina e ao Caribe no contexto mundial.

Pareceria um despropósito propor a mera reconstrução e replicação de experiências passadas. Os próximos dois anos serão tempos de mudanças políticas e dinamismo social que terão seus reflexos no tabuleiro político latino-americano e caribenho. O calendário eleitoral de 2021 indica disputas presidenciais no Equador, Peru, Honduras, Nicarágua, Chile e Costa Rica, e eleições intermediárias na Argentina e no México. Em 2022, acontecerá o mesmo na Colômbia e no Brasil. Paralelamente, em diferentes países como Chile, Bolívia e Cuba, surgem novos processos de representação, organização política e agenda de direitos. Embora esse panorama indique certamente vigor democrático, não é possível afirmar se será possível evitar caminhos turbulentos e, por momentos, de legalidade duvidosa que se repetem na vida política da região.No âmbito internacional, serão diferenciados os pontos de equilíbrio e as margens de autonomia diante das pressões/oportunidades provenientes da dupla dependência da China e dos e eua. É previsível uma presença ampliada da China nos esforços de recuperação econômica na América Latina e no Caribe, seja por canais bilaterais ou por meio de novos compromissos nos âmbitos multilaterais regionais como a Celac ou a Cepal. Também é previsível um cenário de incentivos para fortalecer os compromissos da região com o universo liberal liderado por Washington, com o provável endosso da ue. Há indícios de que o governo de Joe Biden impulsionará um interamericanismo renovado, com especial atenção para os temas de direitos humanos, proteção ambiental e migrações. Não parece previsível que esse «revival» implique reduzir a influência combinada da base eleitoral latina da Flórida e do Comando Sul15. A decisão da nova administração de postergar para o segundo semestre de 2021 a Cúpula Hemisférica significa adicionar um tempo prudencial para ordenar a agenda e preparar o terreno. Isso servirá também para conhecer com mais clareza o entrecruzamento entre os canais de negociação e diálogo eua-América Latina e Caribe, e as expectativas estratégicas de Washington na região. Está claro que haverá prioridades, como já foi indicado com o anúncio da Aliança para a Prosperidade, um programa de quatro anos e quatro bilhões de dólares para atender às causas da migração a partir da América Central e que segue rumo semelhante ao Plano de Desenvolvimento Integral impulsionado pela sub-região com a Cepal.

Quando observamos a situação atual da região à luz das análises e dos diagnósticos recentes, torna-se visível que somos muitos os que constatamos o esvaziamento latino-americano com enorme inquietude. Juntamente com as contribuições recentes dos autores que acompanham os temas regionais, concluímos que a conjuntura imposta pela pandemia de covid-19 ampliou ainda mais a fissura entre regionalismo e regionalidade.

O ano de 2020 acabou representando um ponto de inflexão para o regionalismo latino-americano e caribenho, certamente seu momento de menor expressão política em uma conjuntura na qual ele se faz extremamente necessário. Neste texto, procuramos resumir os acontecimentos e processos que conduziram a esse esvaziamento. Embora o pessimismo da razão deixe pouco espaço para otimismo da vontade, consideramos necessário buscar horizontes construtivos que impulsionem outro tipo de tendência.

Destacamos como conclusão seis rotas de escape que deveriam orientar esse esforço: (a) coordenação intergovernamental regional para enfrentar a pandemia de covid-19 e seus dramáticos impactos econômico-sociais; (b) diálogo político de caráter regional com o governo da Venezuela, os setores políticos de oposição e as organizações sociais desse país, especialmente para apoiar uma saída pacífica, plural e socialmente inclusiva para seus cidadãos; (c) apoio ao processo de paz na Colômbia, já que sua interrupção e erosão levam ao risco de que o Acordo de 2016 se transforme em letra morta; (d) atenção para a gravíssima situação humanitária que afeta os fluxos de migrantes, refugiados e deslocados tanto na Mesoamérica como na América do Sul, hoje mais urgente devido à pandemia; (e) esforços para que as instituições interamericanas recuperem representatividade, legitimidade e funcionalidade para operarem como espaços de diálogo e busca de interesses comuns, e não de condescendência com o projeto de poder dos eua; e (f) ênfase na necessidade de que a América Latina e o Caribe reajam ao isolamento e à irrelevância no plano internacional, seja a partir dos espaços mini e multilaterais, das instâncias soberanas das políticas exteriores de seus países ou de iniciativas de atores não governamentais e movimentos sociais. Para superar o isolamento e a irrelevância, é crucial que o regionalismo possa se reativar a partir de ações que reflitam interesses comuns, tangíveis e factíveis com atenção para os temas de máxima urgência.

  • 1.

    Bruce Jones e Susana Malcorra: Competing for Order: Confronting the Long Crisis of Multilateralism, University School of Global and Public Affairs, Brookings, 2020.

  • 2.

    Kevin Parthenay: A Political Sociology of Regionalisms: Perspectives for a Comparison, Palgrave Macmillan, Cham, 2019.

  • 3.

    Diana Panke e Soren Stapel: «Exploring Overlapping Regionalism» em Journal of International Relations and Development No 21, 11/2016.

  • 4.

    Frederic Kliem: «Regionalism and Covid-19: How eu-asean Inter-Regionalism Can Strengthen Pandemic Management», relatório de políticas, S. Rajaratnam School of International Studies, Nanyang Technological University, Singapura, 2020.

  • 5.

    Natalia Saltalamacchia Ziccardi: «La Celac y su vinculación con actores extrarregionales» em Wolf Grabendorff e Andrés Serbin (eds.): Los actores globales y el (re)descubrimiento de América Latina, Icaria, Barcelona, 2020.

  • 6.

    G. González González: «¿Qué se espera del rol del México en el Consejo de Seguridad de la onu?» em Nueva Sociedad, edição digital, 11/2020, www.nuso.org; M. Hirst e Tadeu Morato Maciel: «O tripé da política externa brasileira no governo Bolsonaro» em Boletim opsa No 3, 7-9/2020.

  • 7.

    C. Romero: «Venezuela: un país bloqueado» em América Latina. El año político 2019, Les Études du ceri No 245-246, 1/2020.

  • 8.

    M. Hirst, C. Luján, C. Romero e J.G. Tokatlian: «La internacionalización de la crisis en Venezuela», Fundação Friedrich Ebert (fes), Buenos Aires, 7/2020, disponível em http://library.fes.de/pdf-files/nuso/16444.pdf.

  • 9.

    Sandra Borda: «Colombia y la crisis venezolana: una estrategia fallida» em Nueva Sociedad No 287, 5-6/2020, disponível em www.nuso.org.

  • 10.

    Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal): «Pactos políticos y sociales para la igualdad y el desarrollo sostenible en América Latina y el Caribe en la recuperación pos-covid-19», Informe Especial Covid-19 No 8, 15/10/2020.

  • 11.

    Cepal: «Los efectos del covid-19 en el comercio internacional y la logística», Informe Especial Covid-19 No 6, 6/8/2020.

  • 12.

    Alberto van Klaveren: «Regionalism in Latin America: Navigating in the Fog», Working Paper Series No 25, seco/wti Academic Cooperation Project, 2018; Federico Merke: «Lo que sabemos, lo que creemos saber y lo que no sabemos sobre América Latina» em Pensamiento Propio No 45, 2018; W. Grabendorff e A. Serbin (eds.): Los actores globales y el (re)descubrimiento de América Latina, cit.; José Antonio Sanahuja: «La crisis de integración y el regionalismo en América Latina: giro liberal-conservador y contestación normativa» em Manuela Mesa (coord.): Ascenso del nacionalismo y el autoritarismo en el sistema internacional. Anuario ceipaz 2018-2019, ceipaz, Madri, 2020.

  • 13.

    Gerardo Caetano, Camilo López Burian e C. Luján: «Liderazgos y regionalismos en las relaciones internacionales latinoamericanas» em Revista cidob d’Afers Internacionals No 121, 2019.

  • 14.

    J.G. Tokatlian: «El descalabro del sistema interamericano» em Nueva Sociedad edição digital, 9/2020, www.nuso.org.

  • 15.

    Edward Knudset: «No Going Back? A Transatlantic Cooperation Agenda under Biden», Hertie School, Jaques Delors Centre, 2020.

Este artículo es copia fiel del publicado en la revista Nueva Sociedad 2021, Agosto - Setembro 2021, ISSN: 0251-3552


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